Panoramas atuais acerca do ensino das ciências

A obra que ora se publica constitui uma parte significativa da tese de doutorado, intitulada Concepções epistemológicas dos professores de Biologia e de Geologia do ensino básico (3.º ciclo) e do ensino secundário e o caso das atividades práticas no ensino das Ciências da Terra e das Ciências da Vida – Contributo para o conhecimento profissional e formação de professores de Ciências da Terra e de Ciências da Vida, apresentada por Jorge Bonito à Universidade de Coimbra em Janeiro de 2006, na especialidade de Formação de Professores, de que fomos orientadores, tendo sido co-orientador o Doutor Carlos Regêncio de Macedo. A sobredita dissertação pretendeu estudar dois problemas assim formulados: 1 – Que tipo de concepções epistemológicas manifestam os professores e os futuros professores de Ciências da Terra e de Ciências da Vida? 2 - Em que medida “um programa de formação didática sobre atividades práticas de campo, baseadas na resolução de problemas dirigida, poderá contribuir para desenvolver o pensamento complexo dos futuros professores?” A supramencionada tese de doutorado, distribuída por dois volumes, comportava, em consonância com o cânone da investigação em Ciências Humanas e Sociais, uma parte de fundamentação teórica e uma outra de investigação de campo, constituída por quatro conjuntos de estudos realizados com amostras diversificadas de sujeitos – alunos das disciplinas de Didática da Biologia I e II e de Didática da Geologia I e II (Universidade de Évora), estagiários destes cursos da mesma Universidade e professores das supramencionadas áreas disciplinares que lecionavam no âmbito geográfico das Direções Regionais de Educação do Alentejo e do Algarve. No estudo que agora é editado, o seu autor optou por privilegiar o ensino das ciências – temática que constituía o quadro teórico da sua dissertação -, desenvolvendo esta matéria em cinco capítulos, três dos quais – 2, 3 e 4 – significativamente precedidos da designação de Panoramas atuais -, o primeiro, justificadamente intitulado Aspectos introdutórios – e o último, debruçando-se sobre uma questão indissociável da do ensino das ciências, ou seja, A profissão e a ação docentes – o novo docente: funções e competências. Reveste-se, indubitavelmente, de inegável pertinência e atualidade a temática que constitui objeto do presente estudo, tendo em conta o alcance que possui, não só no processo de formação dos docentes de Biologia e de Geologia, mas também no sentido de despertar nos alunos, nomeadamente nos do 3.º ciclo do ensino básico e nos do ensino secundário, um interesse acrescido pela Ciência, indo ao encontro de tendências atuais que pretendem proporcionar-lhes meios de reflexão sobre os processos de elaboração do conhecimento científico e da tecnologia, bem como das inter-relações que mantêm com a sociedade e a intervenção no ambiente. É por demais evidente que não será possível otimizar os sistemas educativos, entre os quais o nosso, sem ter em conta o lugar insubstituível que, nas mudanças subjacentes àquela otimização, ocupam os professores, ou, mais precisamente, a relevância que contém o respectivo conhecimento profissional. Neste último, destacam-se, como fator incontornável, as concepções epistemológicas que apresentem, nomeadamente, no caso da Biologia, da Geologia e de áreas afins, acerca da Ciência. Neste sentido, verifica-se uma sensível inflexão no ensino da Didática das Ciências nos últimos quinze a vinte anos, o qual, marcado, em período anterior aos anos oitenta, por um paradigma de natureza positivista, se tem vindo, progressivamente, a converter num paradigma que valoriza a Epistemologia da Ciência e os processos de aquisição e de elaboração do conhecimento científico. A este respeito, é perfeitamente legítima a inserção de questões epistemológicas no ensino dos futuros docentes de Biologia e de Geologia, sendo perfeitamente justificado o lugar concedido por Jorge Bonito, nos capítulos 2 e 3 desta obra, às perspectivas epistemológicas e psicológicas acerca do ensino das Ciências. Além da atualidade e pertinência da temática que atravessa a presente obra, esta é, também, merecedora de valoração muito positiva pela notável erudição em domínios, como a Filosofia do Conhecimento, a Epistemologia, a Psicologia – particularmente do paradigma metateórico que constitui o cognitivismo -, e a Didática. Em seguida, há uma preocupação problematizadora, que atravessa Panoramas atuais acerca do ensino das Ciências, particularmente presente nos capítulos 2, 3 e 4, este último ao analisar a dicotomia teoria-prática, antinomia, que, como acertadamente escreveu, deve ser eliminada “para se passar a desenvolver um percurso de aprendizagem das ciências globais, garantindo uma continuidade entre as teorias e as absolutamente necessárias experiências.” A propósito deste capítulo, salientemos a pertinência das posições expostas, que contemplam questões essenciais, como a conceitualização das atividades práticas, “o olhar crítico” que sobre as mesmas deve ser lançado, o papel da motivação, as modalidades dos trabalhos práticos, as competências, as atitudes e os mapas conceituais para referir tão-só algumas das mais pertinentes e sujeitas a compreensível e justificado debate, não esquecendo a relevância da segurança nas atividades práticas com a qual termina o capítulo 4. A presente obra constitui um contributo relevante para o estudo das concepções epistemológicas para o ensino das Ciências da Terra e das Ciências da Vida, particularmente no que concerne ao papel que as atividades práticas desempenham no mesmo. É um estudo que merece ser lido por professores dos diversos níveis de ensino, por formadores de professores do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário nas áreas supramencionadas e afins e por todos os que se interessam por questões de natureza epistemológica e metodológica. Jorge Bonito, detentor de um apreciável curriculum científico e pedagógico, confirma, na obra ora editada, qualidades de investigação e preocupações de natureza pedagógica que são garantia de um percurso universitário brilhante. Nicolau de Almeida Vasconcelos Rapos