O potencial terapêutico dos bacteriófagos e as infeções nosocomiais

Trabalho Final de Mestrado Integrado, Ciências Farmacêuticas, 2022, Universidade de Lisboa, Faculdade de Farmácia.Os bacteriófagos, descobertos há pouco mais de um século, são vírus que infetam bactérias, capazes de destruir as células bacterianas. Essa descoberta conduziu, na altura, à sua aplicação no combate a doenças infecciosas bacterianas. Mais tarde, a descoberta da penicilina e de outros antibióticos, associada ao reduzido conhecimento da biologia dos fagos, levou a um desinvestimento na utilização desses agentes para fins terapêuticos. Hoje em dia assistimos a um grande aumento de bactérias resistentes aos antibióticos, sendo a multirresistência antibiótica um grande desafio de saúde pública com várias implicações a nível não só da saúde, mas também económicas e sociais. Este problema, associado a um abrandamento muito significativo na descoberta de novas moléculas antibacterianas, tem levado à procura de novas soluções terapêuticas. Em consequência, tendo em conta a vasta diversidade de bacteriófagos na natureza, estes ressurgem como uma possibilidade de contribuir para uma solução necessária e urgente para o problema das infeções por bactérias multirresistentes. Um dos grandes problemas em termos de Saúde Pública relaciona-se com as infeções adquiridas em ambiente hospitalar. Estima-se que ocorram cerca de 8,9 milhões de infeções nosocomiais na Europa anualmente, infeções estas que estão muito associadas ao desenvolvimento de multirresistência bacteriana aos antibióticos, tendo em 2018 sido responsáveis por 24 mil mortes. A situação preocupante levou a que a Organização Mundial da Saúde divulgasse uma lista de agentes patogénicos considerados prioritários para pesquisa e desenvolvimento de novos antibióticos, sendo Acinetobacter baumannii, Pseudomonas aeruginosa e a família Enterobacteriaceae classificados como prioridade crítica. Os locais de infeção mais frequentes associados ao internamento hospitalar são o trato urinário, a corrente sanguínea, infeções do local cirúrgico e o trato respiratório inferior. Estas infeções associadas a bactérias com elevada propensão para formar complexas comunidades de biofilmes, tornam ainda mais difícil encontrar uma solução terapêutica. A nível hospitalar são desenvolvidas várias estratégias para a prevenção de infeções nosocomiais, não sendo por vezes suficientes ou completamente efetivas. A utilização de bacteriófagos para combater bactérias patogénicas tem sido objeto de pesquisa e desenvolvimento, considerando as suas vantagens e desvantagens relativamente à antibioterapia. O objetivo é então entender, perspetivando a nível futuro a partir dos estudos mais recentes, as aplicações terapêuticas dos fagos e a possibilidade destes agentes complementarem a ação dos antibióticos, de forma a contornar o problema emergente da multirresistência antibiótica.Bacteriophages, discovered just over a century ago, are viruses that infect bacteria, capable of destroying bacterial cells. This discovery led, at the time, to their application in fighting infectious bacterial diseases. Later, the discovery of penicillin and other antibiotics, coupled with the limited knowledge of phage biology, led to a disinvestment in the use of that agents for therapeutic purposes. Nowadays we are witnessing a large increase in antibiotic resistant bacteria, being antibiotic multi-resistance a major public health challenge with several implications not only in terms of health, but also economic and social. This problem, associated with a very significant slowdown in the discovery of new antibacterial molecules, has led to the search for new therapeutic solutions. As a result, given the vast diversity of bacteriophages in nature, they reappear as a possibility to contribute to a necessary and urgent solution to the problem of infections by multidrug-resistant bacteria. A major public health problem is related to hospital-acquired infections. It is estimated that about 8.9 million nosocomial infections occur in Europe every year, infections that are closely associated with the development of multidrug-resistant bacteria and were responsible for 24,000 deaths in 2018. The worrying situation has led the World Health Organization to release a list of pathogens considered a priority for research and development of new antibiotics, with Acinetobacter baumannii, Pseudomonas aeruginosa and the Enterobacteriaceae family classified as a critical priority. The most frequent sites of infection associated with hospitalization are the urinary tract, bloodstream, surgical site infections, and lower respiratory tract. These infections associated with bacteria with a high propensity to form complex biofilm communities make it even more difficult to find a therapeutic solution. Several strategies for the prevention of nosocomial infections have been developed at the hospital level, but sometimes they are not sufficient or completely effective. The use of bacteriophages to combat pathogenic bacteria has been the subject of research and development, considering their advantages and disadvantages over antibiotherapy. The aim is then to understand, looking ahead from the most recent studies, the therapeutic applications of phages and the possibility of these agents to complement the action of antibiotics, in order to circumvent the emerging problem of antibiotic multidrug resistance