Roer o roído: ironia e multiperspectivismo narrativo em Dom Casmurro, de Machado de Assis

Dom Casmurro é uma obra roída pela ironia. A ironia, que não ama ou detesta, somente rói, abre lacunas no romance, construindo sua ambuiguidade estrutural. Este trabalho objetiva compreender a poética irônica de Machado de Assis. Partindo da análise do multiperspectivismo narrativo nos romances machadianos de primeira pessoa, pretende-se destacar o papel do defunto-autor e dos caracteres tragicômicos no romance. A obra machadiana insere-se em uma tradição do romance como drama de caracteres. Tal drama é a síntese harmoniosa de polos antitéticos. O primeiro capítulo dedica-se a uma releitura da fortuna crítica relativa à obra de Machado de Assis, indicando as tendências das teorias centradas em pressupostos psicológicos, sociais e autobiográficos da vertente tradicional-historiográfica. No primeiro capítulo, também são indicados os teóricos que contribuíram para o estudo da obra machadiana centralizado na inventividade do romance. No segundo capítulo, há uma investigação a respeito do narrador crítico, irônico, tragicômico e reflexivo nas obras machadianas, em especial os romances de primeira pessoa, tomando como base os esclarecimentos de Franz Stanzel. Pretende-se focalizar Dom Casmurro como obra estruturada em múltiplas perspectivas narrativas. Finalmente, no terceiro capítulo, segue-se a elucidação de eixos temáticos que contribuem para a interpretação do romance: tempo e memória, autoria ficcional, a ópera da vida, confluência de tragédia e comédia, a intertextualidade entre Machado de Assis e Shakespeare, o mecanismo de mimetismo antagônico e a tessitura lacunar do romance.Dom Casmurro is a novel gnawed by irony. The irony, which doesn’t love or loathe, but only gnaws, opens up voids at the romance, constructing its structural ambiguity. This work aims for comprehending the Machado de Assis’ ironic poetics. From the analysis of the narrative multiperspectivism present in machadian novels of first person, it intends to accentuate the dead author’s role and the tragicomic characters. The machadian works insert themselves in a romance tradition known as the drama of characters. This game is a harmonious synthesis of unethical poles. The first chapter dedicates to a rereading of the critical fortune in relation to Machado de Assis’ work, indicating the tendencies of the theories centered in psychological, social and autobiographical assumption. In the second chapter there is an investigation of the critical, ironical, tragicomic and autoreflexive narrator in the machadian works, specialy in the first person novels, based upon Franz Stanzel’s elucidation. It intends to focus on Dom Casmurro as a work structured in multiple perspective narratives. Conclusively, in the third chapter, it follows the elucidation of a thematic axis which contributes to the interpretation of the novel: time and memory, fictional authorship, the life opera, confluence of tragedy and comedy, the intertextuality between Machado de Assis and Shakespeare, mechanism of antagonic mimetism and novel’s voidness structure