Dos hábitos aos habitus: a (re)produção de sentidos no letramento escolar

O letramento escolar tem preconizado funções de leitura e de escritacujos valores estãofixados no ideáriodascompetênciasque ultrapassam os limites da escola e alcançam os espaços da vida cotidiana dos sujeitos, orientando não apenas eventos de comunicação, mas concepçõessobre a natureza e as potencialidades da pessoa.Desse modo, o ensino da leitura e da escrita temrespondido ao modelo autônomode letramento, que pressupõe haver apenas um modo de ser letrado, este, associado ao alcance de cidadania plena de direito e deveres, desenvolvimento e progresso individual e coletivo.Ocaráter impositivo desta práticaconfigura-se comoviolência simbólica na medida em que exclui do sujeito a possibilidade de outras formas de relação com a leitura e a escrita,gerando matrizes de comportamento, habitus, marcadas pela aceitação das regras e das sanções do letramento escolar como neutras e universais. Nesse sentido, este trabalho tem como objetivo geralanalisar,a partir dos sentidos atribuídos por um grupo de11estudantesdo 9º ano doEnsino Fundamental Anos Finais, de que modoo letramento escolar constitui-se em expressão da violência simbólica. Para tanto, adotamos como instrumento de coleta de dados, o Grupo Focal, a codificação da Teoria Fundamentada como método de tratamento dos dados e a Análise de Conteúdo,baseada na unidade de análise Tema, como estratégia para a análiseinterpretativa das falas no grupo.Os dados foram analisados e discutidos a partir dos pressupostos teóricos dos Estudos Culturais, dos Novos Estudos sobre o Letramento, da Psicologia da Educaçãoe de conceitos sociológicos de Pierre Bourdieu.Os resultados mostram que há manifestações de violência simbólica presentes na crença de que apenas o letramento escolar asseguraum modo de vida superior,ascensão social e progresso pessoal; na naturalização dasdisposições da cultura escolar sobre a competência; nos valores adotados para medir-se a si mesmo e aosoutros;na crença de que só peloletramento escolar há a possibilidade de uma pessoa ser considerada plenamente funcional e adequada para viver em sociedade; na naturalização do esforço adicional que o grupo precisa empreender para adequar seu padrão linguístico ao normatizado pela escola;eno reconhecimento da superioridade do letramento escolar frente a outras formas de relação de escrita e de leitura, inclusive a de suas próprias experiências fora da escola.Diante disto, refletimos sobre as possibilidades de alcançar propostas de letramento na escolaque desnaturalizem o discurso sedimentado sobre convicções acerca de uma cultura que, tomada presumidamente como legítima, é investida de privilégios, paradarvisibilidade e relevância àmultiplicidade de letramentos que se dão, inclusive, fora da escola.The school literacy has advocated tasks of reading and writing whose values are determined in the ideals of the skills that go beyond the boundaries of the school and reach the spaces of everyday life of individuals, guiding not only communication events, but alsoconceptions of the nature and potential of the person. Thus, the teaching of reading and writing has responded to the autonomousmodel of literacy, which assumes there is only one way of being literate, this, combined with the range of full citizenship rights and duties, and developing individual and collective progress. The slam of this practice is characterized as symbolic violence insofar as it excludes the possibility of the subject of other forms of relationship with reading and writing, creating arrays of behavior, habitus, marked by theacceptance of rules and sanctions of schooled literacy as neutral and universal. Thus, this study aims at analyzing, from the meanings assigned by a group of 11 students in the 9th year of elementary school, how literacy in school is an expression of symbolic violence. To this end, we adopted as an instrument of data collection, the Focus Group, the codification of Grounded Theory as a method of data treatment and Content Analysis, based on the analysis unit theme, as a strategy for interpretive analysis of the speeches in the group. Data were analyzed and discussed from the theoretical assumptions of Cultural Studies, the New Literacy Studies, Psychology of Education and sociological concepts of Pierre Bourdieu. The results show that there are symbolic manifestations of violence present in the belief that only the school literacy ensures a superior way of life, social mobility and advancement personnel, the provisions of the naturalization of school culture on the jurisdiction, the values adopted to measureto yourself and others, in the belief that only by school literacy is the ability of a person be considered fully functional and suitable to live in society, the naturalization of the additional effort that the group needs to take to adapt their language to the standard regulated by the school , and in recognition of the superiority of school literacy to other forms of relationship of writing and reading, including your own experiences outside of school. Given this, we reflect on the possibilities of achieving literacy in school proposals that denaturalizes speech settled on beliefs about a culture that, presumably taken as legitimate, is invested with privileges, the visibility and relevance of the multiple literacies that take place, even outside of school