Nas infâmias da docência : contingência, currículo e exercício docente na sala de aula

Esta pesquisa foi inspirada no conceito de infâmia (FOUCAULT, 2006) e pretendeu dar visibilidade ao exercício sem fama e, muitas vezes, sem reconhecimento do professor em sala de aula, objetivando analisar as implicações do atravessamento das contingências no exercício da docência em sua relação com o currículo em uma turma do segundo ano do Ensino Fundamental. Quanto mais rápido é um movimento, menos detalhada é nossa percepção sobre ele, portanto, como meio para desacelerar o ritmo frenético do cotidiano escolar e fazer existir o detalhe no micro espaço da sala de aula a autoetnografia foi usada como metodologia para a produção dos dados no átimo de seu acontecimento. Este estudo qualitativo associou a perspectiva da autoetnografia à tecnologia digital, oferecendo novos arranjos para a pesquisa, neste momento em que vivemos uma mudança no paradigma comunicacional. O aplicativo para dispositivos móveis WhatsApp, por sua característica dialógica e pela segurança que oferece aos dados, protegidos por criptografia e de fácil recuperação, foi a ferramenta eleita para a elaboração de um áudio-diário contendo os registros feitos por mim, professora-pesquisadora, das situações, dos movimentos, das reações e das implicações do cotidiano da sala de aula. No WhatsApp os registros foram compartilhados em um grupo intitulado Diário de pesquisa no qual foram incluídos a professora orientadora e o técnico que fez a transcrição dos excertos. O corpus empírico referiu os registros do ano letivo de 2018 na turma do segundo ano do Ensino Fundamental de uma escola pública municipal em Porto Alegre, Rio Grande do Sul. A pesquisa foi desenvolvida na interseção de três conceitos que funcionaram como operadores teóricos e metodológicos: o currículo, entendido em seu aspecto macro como educação maior (políticas curriculares) e micro como educação menor (sala de aula); a contingência, tomada como acaso, incerteza no desenrolar de um tempo presente em plena atualidade e o exercício docente, tornado visível por esse cruzamento. Registrar as contingências que interpelaram a docência em seu acontecer cotidiano foi deveras importante para dar a dimensão dos atravessamentos que implicam no exercício da docência. A contingência foi um conceito estruturado com base em teorizações foucaultianas, amarrado à noção de atualidade e à ontologoia histórica do presente enquanto tarefa da crítica deste tempo. A contingência é uma noção que carrega tanto um fator de imprevisibilidade e acaso quanto de datação. Dentre os achados, quatro tipos mais recorrentes de contingências vivenciadas em sala de aula foram estudadas: aquelas ligadas 1) ao tempo; 2) às relações entre os sujeitos; 3) ao aleatório; 4) ao currículo em funcionamento. O exercício da docência, materializado na ação miúda da professora em sua sala de aula e construído em meio a situações incertas, cambiantes e produtivas, revelou um universo outro, repleto de rupturas e descontinuidades que produziu, de um modo possível, o currículo que praticou: um currículo-contingente.This research was inspired by the concept of infamy (FOUCAULT, 2006) and intended to give visibility to the exercise without fame and, often, without recognition of the teacher in the classroom, aiming to analyze the implications of crossing contingencies in the exercise of teaching in their relationship with the curriculum in a class of the second year of elementary school. The faster a movement is, the less detailed our perception of it is, therefore, as a mean of slowing down the frantic pace of school life and making detail in the micro-space of the classroom autoethnography was used as a methodology for the production of data at the moment of its happening. This qualitative study associated the perspective of autoethnography with digital technology, offering new arrangements for research, at this time when we are experiencing a change in the communicational paradigm. The application for WhatsApp mobile devices, due to its dialogical characteristic and the security it offers to data, protected by encryption and easy to recover, was the chosen tool for the elaboration of an audio-diary containing the records made, as a teacher-researcher, of the situations, movements, reactions and implications of the classroom's daily life. On WhatsApp, the records were shared in a group entitled Research Diary, which included the guiding professor and the technician who transcribed the excerpts. The empirical corpus referred to the records of the 2018 school year in the second-year class of elementary school at a municipal public school in Porto Alegre, Rio Grande do Sul. The research was developed at the intersection of three concepts that functioned as theoretical and methodological operators: the curriculum, understood in its macro aspect as major education (curricular policies) and micro as minor education (classroom); the contingency, taken as chance, uncertainty in the development of a time present in the present time and the teaching exercise, made visible by this intersection. Registering the contingencies that challenged teaching in its daily occurrence was very important to give the dimension of the crossings that imply the exercise of teaching. Contingency was a concept structured based on Foucaultian theorizations, tied to the notion of the present and the historical ontology of the present as a task of criticism of this time. Contingency carries both a factor of unpredictability and chance as well as dating. Among the findings, four most recurrent types of contingencies experienced in the classroom were studied: those linked 1) to time; 2) the relationships between the subjects; 3) random; 4) the working curriculum. The exercise of teaching, materialized in the small action of the teacher in her classroom and built amid uncertain, changing and productive situations, revealed a different universe, full of ruptures and discontinuities that produced, in a possible way, the curriculum she practiced: a contingent curriculum